A música popular passa a ser o espaço "nobre", onde se articulam, são avaliadas e interpretadas as contradições socioeconômicas e culturais do país, dando-nos por tanto seu mais fiel retrato.
Silviano Santiago
Ouro de Tolo - Raul Seixas
Eu devia estar contente
Porque eu tenho um emprego
Sou um dito cidadão respeitável
E ganho quatro mil cruzeiros por mês
Eu devia agradecer ao Senhor
Por ter tido sucesso na vida como
artista
Eu devia estar feliz
Porque consegui comprar um Corcel 73
Eu devia estar alegre e satisfeito
Por morar em Ipanema
Depois de ter passado fome por dois anos
Aqui na Cidade Maravilhosa
Ah! Eu devia estar sorrindo e orgulhoso
Por ter finalmente vencido na vida
Mas eu acho isso uma grande piada
E um tanto quanto perigosa
Eu devia estar contente
Por ter conseguido tudo o que eu quis
Mas confesso abestalhado
Que eu estou decepcionado
Porque foi tão fácil conseguir
E agora eu me pergunto: E daí?
Eu tenho uma porção de coisas grandes
Pra conquistar, e eu não posso ficar aí
parado
Eu devia estar feliz pelo Senhor
Ter me concedido o domingo
Pra ir com a família ao Jardim Zoológico
Dar pipoca aos macacos
Ah! Mas que sujeito chato sou eu
Que não acha nada engraçado
Macaco praia, carro, jornal, tobogã
Eu acho tudo isso um saco
É você olhar no espelho
Se sentir um grandessíssimo idiota
Saber que é humano, ridículo, limitado
Que só usa dez por cento de sua Cabeça
animal
E você ainda acredita que é um doutor,
padre ou policial
Que está contribuindo com sua parte
Para nosso belo quadro social
Eu que não me sento
No trono de um apartamento
Com a boca escancarada cheia de dentes
Esperando a morte chegar
Porque longe das cercas embandeiradas
que separam quintais
No cume calmo do meu olho que vê
Assenta a sombra sonora de um disco
voador
POSTEI ESTA MÚSICA PARA FAZER UM BREVE COMENTÁRIO
Estava eu e alguns alunos na calçada da Escola, esperando o
ônibus que eles viajam para suas casas ao final do dia e como de costume
a Direção da Escola. Sim por que é habitual que uma pessoa da Direção
os acompanhem, até que o último aluno embarque. Hoje eventualmente,
era eu a pastoreia.
Mais adiante havia um carro estacionado com um som que
tocava a música "Ouro de Tolo" de Raul. Em um dado momento um dos alunos, exclamou a seguinte frase: - Como pode um pessoa escutar uma música ridícula dessa meu irmão?!!!! Nesse momento, entrei em campo e fui explicar para oJovem, o que na minha concepção de educadora e transmissora de saberes está faltando na grande maioria dos educadores do Brasil. “A vontade de mostrar com olhos de sabedoria o que está "embutido" sim, embutido do verbo "esconder" nas letras de músicas que os jovens atuais estabeleceram como ridículas.” É ridículo ir a rua lutar por direitos da cidadania?
Fazendo uma análise rasa e cotidiana, se descobre coisas bárbaras como: a falta do contentamento pelas coisas que conquistamos (quanto mais temos mais queremos) - eu devia, eu devia, ou a falta de interesse por tudo que adquiriu; Mas, o mais incrível é que existe todo um contexto voltado para as militâncias de 1964. Tudo bem que Raul, não foi nenhum aguerrido das lutas pelo fim da Ditadura Militar, mas, esse descontentamento pode indicar que havia uma pretensão de sairde sua zona de conforto, ao dizer "Se olhar no espelho e sentir-se um grandessíssimo idiota" e reconhecer a sua impotência - "ridículo, limitado que só usa 10% de sua capacidade de pensar e agir. Ele ainda atenta para as desigualdades sociais nas pessoas do Doutor, do padre e do policial que ora exercia os desmandos dos ditadores. Raul Seixas nunca foi exilado político, por decisão própria promoveu seu auto exílio. Suas músicas muito loucas tinham cunho revolucionários, como podemos citar a "Sociedade Alternativa" movimento que ele trouxe para o Brasil. Assim "ouro dos tolos" para osrevolucionários eram representados através de músicas. Nem sempre músicas, mas mensagens para os colegas que lutam e/ou para a população.
"Nem tudo que reluz é ouro
Nem todoa música é música"
"Nem tudo que reluz é ouro
Nem todoa música é música"
Chico Buarque de Hollanda era o preferido pela Censura
Truculência, violência
Dilma, nossa presidente esteve na mira da Ditadura
Carlos Lamarca,
A música popular passa a ser o espaço "nobre", onde se articulam, são avaliadas e interpretadas as contradições socioeconômicas e culturais do país, dando-nos por tanto seu mais fiel retrato.
Silviano Santiago
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