Eu, a cama e Nobelina
Zé Laurentino
Seu moço vou lhe contar
uma historia pequenina,
historia de um casamento
que tive com a Nobelina.
Nobelina, meu patrão
morava parede e meia
no sítio donde eu morava
não era lá muito feia,
também não era bonita,
mais tinha o corpo roliço
e os óios da mulata
parecia ter feitiço.
O corpo de Nobelina
endoidava qualquer macho
pois era fino no meio
porém muito grosso embaixo
a cintura da muié
era uma tentação
parecia inté que tinha
sido feita com a mão.
Para o nosso casamento
eu tinha feito um estudo,
a nossa casa pequena
mais tava pronta de tudo
desde a cama, o principal
ao troço mais miúdo.
Todo dia ao meio dia
eu encostava a enxada
mode feliz contemplar
nossa futura morada.
Em meio à mata serena
a casinha era pequena
mais tava bem arrumada
com cinco ou seis tamboretes
uma mesa, um petisqueiro,
uma banca, uma quartinha,
quengo, prato, candeeiro
e um coração de Jesus
de olhinhos bem azuis
que eu comprei no Juazeiro.
E oiava aqueles troços
que nem quem assiste um drama
pois tudo fica bonito
no tempo que a gente ama
mais entre os troços, patrão
um me prendia a atenção
era a danada da cama.
Eita troço abençoado,
de qualquer uma invenção
que o homi fez até hoje,
gravador, televisão,
telefone e telegrama,
pois quem inventou a cama
pra’ mim é o campeão.
Cama é o único objeto
que nunca causa acidente
da queda de uma cama
nunca vi ninguém doente.
Cama é sempre uma cama
seja ela fraca ou cara
cama de couro de boi,
ou cama feita de vara.
Cama coberta de linho,
cama coberta de esteira,
a cama silenciosa
e a cama estaladeira.
Cama que guarda segredo
por isso eu lhe quero bem
porque ela assiste a tudo
sem dizer nada a ninguém.
Quando eu estou doente
a cama é quem me socorre
na cama eu curo a ressaca
depois de um dia de porre
e nela a ressaca vai-se,
é na cama que se nasce,
é na cama que se morre.
De toda música do mundo
eu lhe digo sem fofoca
para mim a mais bonita
é a música que a cama toca.
Aquele seu rangidinho
só rangido de porteira
faz a gente adormecer
nos braços da companheira.
Nem os baiões de Gonzaga,
nem o acordeon de Noca
toca musica mais bonita
do que o que a cama toca.
Mais eu vou deixar a cama
minha companheira alpina
pra’ falar do casamento
que eu tive com a Nobelina.
Tudo pronto, tudo certo
casei-me com a morena
passado uns cinco ou seis meses
nós fomos pra’ uma novena
e a novena era na casa
de seu Antonio Sibiu
por motivo da chegada
de um seu filho Dario
que há quatro ou cinco dias
tinha chegado do Rio.
Quando nós chegamos lá
já tinha gente demais
a novena era do santo
mais veja o que o povo faz
em vez de falar do santo
só falava no rapaz.
Mais como ele tá gordo,
como ele voltou bonito
era a conversa das moças
mas achei muito esquisito
só porque a Nobelina
ao falar com o rapaz
sustentou na sua mão
que quase não solta mais.
Eu fiz que não tava vendo
fui beber no botequim
dei uma cordinha a ela
porque muié é assim,
quando tá com a corda toda
mostra se é boa ou ruim.
E quando eu voltei, seu moço
já fui vendo o carioca
grudado com a Nobelina
e os dois numa fofoca
que uma cachorrada daquela
só vi na casa de Noca.
A essa altura, patrão
me deu sono pra’ dormir
fui convidar Nobelina
porém ela não quis ir
tive que voltar sozinho,
sozinho na madrugada
e nessa noite doutor,
a cama não tocou nada.
Mais não tem nada seu moço,
eu não vou lamentar, pois
Nobelina foi-se embora
eu arranjo outra depois,
quem é forte não reclama
mesmo porque minha cama
só sabe tocar com dois.
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